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[ quarta-feira, 10 de dezembro de 2008 | 6 comentários ]

VIVENDO A RESTAURAÇÃO
PRIMEIRA PARTE

A Missão Mobilização tem sido desafiada a ampliar sua visão e experiência de viver e ser uma expressão da igreja desde o seu início, procurando pela profundidade da simplicidade, transicionando de uma mentalidade institucional para uma realidade de filiação e herança, fundamentada em Cristo (Filhos Semelhantes a Jesus), voltada para pessoas ao invés de estruturas, trabalhando pela unidade da fé em amor, zelando pela base familiar do Reino de Deus (Atos 2.44 “Todos os que creram estavam juntos e tinham tudo em comum”). Porém, para alcançarmos essa realidade tem sido necessário sujeitar-se a um processo em que devemos mostrar frutos de restauração.

É muito comum atribuirmos tudo o que somos eclesiasticamente ao resultado de uma “Reforma institucional”, definida geralmente como um “Movimento religioso dos começos do séc. XVI, que rompeu com a Igreja Católica Apostólica Romana, originando numerosas igrejas cristãs dissidentes, propondo um conjunto de mudanças efetuadas com o fim de torná-la mais fiel à forma de suas origens”[1]. O significado do termo Reformar ou renovar eqüivale a dar a forma que se tinha quando novo, por isso, originalmente o termo caracterizava aquelas igrejas do século XVI que se levantaram para dar à Igreja da Idade Média a funcionalidade da Igreja so primeiro Século. Usando a própria definição de Aurélio (Não que essa seja a mais completa), vemos que a Reforma deveria nos tornar mais fiéis á forma de nossas origens, porém, ainda continuamos caminhando sobre o legado da “forma” de pensamento grego-romano na Teologia, Filosofia, Liturgia, Economia e assim por diante, nosso fundamento apostólico ainda é Romano.

Não queremos com essa observação menosprezar esse momento da história, entendemos que a “Reforma” teve e ainda tem seu papel e sua importância, mas não suficiência. Não restringimos a reforma ao luteranismo ou movimentos isolados, também cremos que sua abrangencia vai além da questão teológica, trazendo novas diretrizes para a prática da fé cristã, porém assim como muitos reformados, cremos que esse momento histórtico representa parte de um processo contínuo que visa nos levar a originalidade.

O termo “Reforma” fala justamente de uma “Nova forma”, por isso, através do movimento reformador, procurou-se por mais fidelidade as suas origens da fé cristã, segundo a mentalidade e padrão de pensamento da sua época, lançando-nos ao desafio de continuar vivendo o processo que nos levará ao encontro de algo mais relevante que uma limitada variação dentro de uma mesma configuração.

Após a “Reforma” protestante, seguidas gerações viveram dias em que valores, princípios e fundamentos foram restaurados, e hoje mais do que nunca, mediante a gritante necessidade de genuinidade, torna-se necessário darmos continuidade a esse processo, porém para isso torna-se necessário ampliarmos nosso entendimento, procurando por algo que esteja além da implantação de novos métodos, algo que harmonize a crise das formas e nos leve de volta a essência, que significa “Buscar pela origem que constitui a natureza da existência de algo, sua substância, sua significação especial e seu espírito, ao invés de apenas sua forma de funcionamento”.

Não podemos continuar acreditando que a resposta dos nossos problemas eclesiásticos está em alguma “Forma de fazer ou viver como Igreja”. Após alguns anos de seguidas tentativas experimentando ser igreja sem prédio, igreja com prédio sem cara de igreja, igreja nas casas, nas casas e no prédio, ou seja, depois de alguns anos experimentando mudar as formas, seguindo o exemplo cíclico da história, temos entendido que “A resposta para essa crise não está na forma de se fazer igreja, pois nenhuma forma, por mais contemporânea que seja, por mais certa e exclusiva que pareça, nenhuma delas é nova, por isso, a resposta pode estar além das formas, pode estar na essência, e essa essência sempre irá falar de pessoas enquanto formas falam de estruturas”.

A partir dessa idéia de originalidade, temos procurado ampliar nossa visão, e transicionar da proposta de reforma para restauração, não no sentido de obter uma nova forma, mas sim de obter de novo a essência perdida, recuperar a idéia predominante estabelecida desde sua origem, de “Recomeçar segundo as escrituras atentando para os princípios que falam da sua identidade, propósito e destino”. Porém, para isso, teremos que “Flexibilizar conceitos pessoais e métodos exclusivos, relativos ao tempo e sujeitos a transitoriedade natural, para estar fundamentados sobre o que permanece, sobre a palavra que determina sua natureza e desenvolve sua existência”.

Ao olharmos para o Hebraico vemos a idéia de “Restaurar”, presente em várias palavras e usada centenas de vezes no sentido de “Renovar seu estado original, restituindo sua verdadeira essência, fundamentando as bases do altar antes do seu pleno funcionamento do templo”. Com base nos gráficos abaixo conseguimos extrair alguns valores dos termos hebraicos.

o Renovar seu estado original.
o Restituindo sua verdadeira essência e significado.
o Estabelecer no sentido de posição e espaço.
o Tomar o seu lugar em atitude de permanência, mantendo posição (2 Crônicas 24.13)
o Fundamentar as bases do altar(templo) antes do seu pleno funcionamento (2 Crônicas 24.7)
o Restaurar a força, prevalecer, fortificar, ser firme e resoluto, Prevalecer sobre. (2 Crônicas 34.10)
o Ser firme, estável, estar estabelecido e fixado com segurança e durabilidade. (2 Crônicas 35.20)
o Ser firmemente determinado e guiado corretamente. (2 Crônicas 35.20)
o Estar pronto, preparado e consolidado (2 Crônicas 35.20)
o Terminar, completar e ser completado (Esdras 4.12)
o Manter-se confirmado. Levantar e permanecer de pé. (Isaias 49.8)
o Retornar ou volta, converter, arrepender ou trazer ou ser trazido de volta (Isaias 58.12).


Hebreus 9.12 “Restaurar a sua condição natural e normal algo que de alguma maneira projeta-se além da sua superfície natural ou está desalinhado como, por exemplo, uma junta do corpo, quebrada ou inchada”.

Essa restauração se dá pelo ser trazido de volta através de arrependimento, de uma nova consciência e mentalidade que nos leva a uma nova posição e direção, restaurando o poder e autoridade dos santos que são a expressão da Igreja. Por isso, entendemos que a igreja não é a causa, mas o efeito, ou seja, a igreja é a expressão dos santos, que por sua vez expressam Cristo, afim de que Deus seja glorificado na terra. Seguindo a terminologia usada em Esdras, acreditamos que “Entendendo o princípio da essência, natureza e a originalidade, poderemos trabalhar sobre um fundamento que nos dará condições de finalizar”, mobilizando santos para levantar na terra e posicionar nas regiões celestiais o que em Cristo já foi estabelecido, ampliando o entendimento de igreja como também, uma realidade de conexão espiritual.

Dentro da linguagem do Novo Testamento, encontramos uma palavra que em algumas versões acabou sendo traduzida por “Reforma”, encontrada em Hebreus 9:10, num contexto que trata a metodologia cerimonial do Tabernáculo, como ordenanças da carne, baseadas em comidas, bebidas e diversos rituais de purificação, impostas até ao tempo oportuno de “Reforma”, palavra que no original grego “Diorthosis” aparece no sentido de “restaurar a sua condição natural e normal algo que de alguma maneira projeta-se além da sua superfície natural ou está desalinhado como, por exemplo, uma junta do corpo, quebrada ou inchada[1]”. Portanto, o termo não aparece no sentido de mudar as formas, mas de restaurar a condição natural e original.

Dessa forma, podemos continuar caminhando sobre o mesmo pensamento, usando como base as principais palavras usadas no Novo Testamento para “Restaurar” como por exemplo: “apokathistemi” (Oito vezes) que tem como seu principal significado restabelecer o seu estado anterior ou estar em seu estado anterior e trabalhando suas raízes pode-se chegar à idéia de estabelecer ou constituir sobre algo separado. (Referencias: Mateus 12.13 Mateus 17.11 Marcos 3.5 Marcos 8.25 Marcos 912 Lucas 6.10 Atos 1.6 Hebreus 13.19).

A partir das raízes terminológicas, chegamos a um dos textos mais significativos com relação à restauração, Atos 3.21, onde uma única vez no NT a palavra “apokatastasis”, relacionada à forma de governo em que a autoridade de Deus é exercida por seus representantes na Terra, apontando para a restauração do estado perfeito antes da queda, confirmando a idéia de restabelecer o estado anterior e original (Atos 3.21 “ao qual é necessário que o céu receba até aos tempos da restauração de todas as coisas, de que Deus falou por boca dos seus santos profetas desde a antiguidade”). Esse posicionamento não representa apenas uma questão de terminologia, mas uma direção que nos dará segurança, protegendo-nos de nós mesmos, da tentação de querer lutar por mais uma nova reforma, sem entender que a proposta para a igreja da última hora ou do terceiro dia, é voltar à essência e a originalidade, que nada mais é do que a expressão viva do próprio Cristo. Observe como é possível visualizar um processo de restauração com base no texto de Atos 3.20-21:


Além disso, gostamos do exemplo usado a respeito do ofício de um restaurador, que tem como objetivo , recuperar a originalidade do móvel danificado, ao invés de apenas reformá-lo podendo acrescentar elementos que não fazem parte de sua forma original. Acreditamos que todo elemento que adicionamos a igreja viola sua originalidade e acaba se tornando agente de crise, fatores internos responsáveis por gerar instabilidade e vulnerabilidade. Por isso, nesse sentido, estamos vivendo o tempo de “céus e terra serem abalados” de Hebreus 12.22-29. Uma palavra pontual que traça o paralelo entre o Sinai e Sião, relacionado ao desenvolvimento da Igreja.

Nesse texto somos exortados a “tomar cuidado” no sentido de discernir o que está acontecendo e não recusar Àquele que do céu nos adverte, hoje, não mais em uma perspectiva terrena e temporal, pois a partir de Sião, não estamos na “sombra”, mas diante da “imagem real”, apontando para um sacerdócio espiritual que nos coloca num novo nível de responsabilidade, por isso, nós “que temos nos desviado daquele que do céu nos adverte”, devemos “tomar cuidado”, pois o dia do Senhor visitar nossas edificações chegou e “aquele, cuja voz abalou, então, a terra; promete, dizendo: “Ainda uma vez por todas, farei abalar não só a terra, mas também o céu.” No Sinai a voz do Senhor abalou a terra ao ponto do povo não querer mais ouvi-lo, porém, sua voz abalará não só a terra como também os céus. Esse termo “abalar” significa o movimento produzido pelos ventos, tempestades, ondas e coisas do tipo que sacodem completamente e causam agitação até mesmo derrubando algo.

A “Voz” do Senhor está Ecoando e o que Ele está falando a igreja nesses dias trará abalos estruturais, a fim de por a prova nossas edificações e fazer com que permaneça apenas o que é eterno, aquilo que está de acordo com o original. Quando diz: “de uma vez por todas farei abalar”, esse “abalar” aparece no sentido de bater, agitar a mente dos homens, para que se prostrem em tremor e temor, falando de uma remoção completa e definitiva das coisas abaláveis.

Esse termo “remoção” vem de “metathesis” significando transferir de um lugar para outro, no sentido de trocar coisas instituídas ou estabelecidas, concordando com Hebreus 9.10. Mas afinal o que será removido? À medida que começarem a cair às chuvas, transbordarem os rios e a soprarem os ventos, tanto sobre os que edificam sobre a areia como aos que edificam sobre a rocha (Mateus 7.27), identificaremos quem verdadeiramente tem edificado sobre o firme fundamento. Portanto, a remoção das coisas abaladas fala da diferença entre o que que faz parte da edificação original daquilo que foi adicionado segundo nossa vontade, fala da diferença daquilo que foi feito no espírito de babel das que foram feitas no espírito de Betel.

A verdade é que tudo aquilo que possa ter sido adicionado por nós ou até mesmo mudado, representa tudo que é abalável, conseqüentemente tudo que será removido para que permaneça apenas o inabalável de Deus. Esse termo “inabalável” aparece no sentido de algo que não pode ser removido ou mudado, de posição permanente, que não cede com facilidade; representando ainda algo que não está sujeito a derrota nem a desordem, permanecendo sempre firme e estável. Dessa forma devemos receber o Reino como ele é, e vivermos a Igreja como ela é e não como gostaríamos que fosse. Perceba que as escrituras chamam a nossa atenção para aquilo que “não é de visível aparência”, ou seja, para aquilo que em Cristo recebemos dentro de nós, conferindo com o texto de Hebreus 12.29 que diz: “Por isso, recebendo nós um reino inabalável, retenhamos a graça, pela qual sirvamos a Deus de modo agradável, com reverência e santo temor; porque o nosso Deus é fogo consumidor”, confirmando a idéia de que a essência de graça, serviço, reverencia e santo temor, precedem as formas de funcionamento.

Por exemplo, diante de uma mulher preocupada em como (balde) tirar a água (poço) , e como adorar (monte), sempre buscando pela uma forma correta, Jesus a encoraja a crer, encontrar a essência, a conhecer quem está diante dela. Jesus anuncia a chegada do novo tempo em que o importante para Deus é a essência (João 4.24). Portanto, essa crise de paradigmas, esse conflito de modelos e a ausência de essência, não é algo peculiar aos nossos dias, mas algo vem se repetindo durante toda a história, dividindo gerações e afetando a expressão da igreja.

Quando falamos que a essência precede a forma, é importante entender que não estamos anulando a forma, estamos afirmando que a forma por si não é a resposta para nossas crises eclesiásticas. Entendemos que a verdadeira essência da igreja será encontrada por filhos de Deus amadurecidos o bastante para corresponderem à multiforme sabedoria de Deus manifesta através da igreja, ou seja, filhos que entenderão a igreja como a expressão dos santos, que nada mais é do que a expressão do próprio Cristo atuando em todas as esperas de influência da sociedade a partir de uma perspectiva espiritual e uma realidade de autoridade e poder que se manifestará na terra de várias maneiras diferentes, mediante a diversidade do espírito coletivo de cada jurisdição, de acordo com a dinâmica de cooperação e ajustes das suas partes.

Percebemos essa diversidade corporativa de forma prática desde em exercícios espirituais realizados em grupos pequenos, até comunidades inteiras que visitamos em cidades diferentes. Trata-se do mesmo Deus que é tudo em todos, atuando de maneira diferente à medida que vivemos a mesma essência. Através dessa percepção estaremos amadurecendo também a nossa visão de unidade, entendendo que muitas vezes tão importante quanto estar junto no mesmo lugar físico, será não atrapalhar o que Deus está fazendo na vida do outro na mesma cidade ou região. Esse entendimento pode cooperar para que continuemos preservando a unidade da fé de maneira saudável. Por exemplo: Assim como usamos a expressão “unha e carne” como um símbolo de unidade, devemos ampliar para a expressão “Boca e cotovelo”, como uma verdade sobre unidade corporativa, mesmo que estes nunca se encontrem. Eles fazem parte do mesmo corpo, e representam um simples exemplo da essência da unidade que precede a forma como viveremos.

A proposta da restauração nos coloca diante de um modelo a ser seguido, à semelhança de Moisés que foi desafiado a edificar algo para Deus segundo o modelo estabelecido por Deus (Atos 7.44 Hebreus 8.5). Isso significa que Deus trabalha com padrões, com mapas e plantas, e mesmo tratando-se de uma realidade de sombra, entendemos a metodologia do Reino, pois se a Igreja é a expressão dos santos, a família de muitos filhos semelhantes a Jesus, entendemos que esse padrão está no cabeça do corpo, no fundamento do edifício, no próprio Cristo que representa o padrão de maturidade (Perfeição) de Deus para todos os santos e conseqüentemente, a Igreja. Portanto, não devemos edificar segundo o padrão que achamos melhor, mas segundo o padrão estabelecido pelo próprio Deus.

Seguindo o decorrer da história bíblica, vemos que os métodos foram ampliados, adequados a cada realidade e segundo sua época, em terra própria ou em exílio, porém a essência permaneceu a mesma, mostrando que devemos restaurar a essência do Tabernáculo, da tenda, do templo, da casa, devemos ser a expressão de Cristo, para que possamos entender o chamado a viver uma realidade multiforme, porém, com o mesmo espírito e essência.

Fraternalmente em Cristo
Anderson Bomfim